Esse poema pulou no meu colo hoje pela manhã... Como deixar um poema maravilhoso desses sem um chamego? Tive que lê-lo e relê-lo... Acariciá-lo e me envolver com ele.
Eu empresto para quem quiser "traduzir-se"!
Traduzir-se
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte de mim
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?
in Na vertigem do dia
GULLAR, Ferreira. Toda Poesia (1950-1999). — 12ª ed. — Rio de Janeiro: José Olympio, 2004.
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